quinta-feira, maio 30, 2013

Defina o que é prioridade na sua vida

Uma leitora me perguntou "o que a gente faz quando precisa fazer um milhão de coisas, mas não tem tempo para nada?". Acho essa pergunta muito pertinente, especialmente depois de haver escrito sobre nossos hábitos e a possibilidade de mudá-los. A minha resposta a ela é a seguinte: precisamos priorizar o que é importante para a nossa vida, já que não podemos fazer tudo ao mesmo tempo. O problema é que todo mundo sabe disso, mas dificilmente conseguimos colocar em prática. Por quê?

Tudo ao mesmo tempo agora

Aprenda idiomas. Faça faculdade. Se possível, faça duas. Faça aquele curso. Veja os novos filmes em cartaz. Leia os clássicos. Esteja presente na vida dos seus amigos. Vá às reuniões de família. Seja voluntário. Ganhe dinheiro. Ganhe mais dinheiro. Ganhe mais dinheiro para comprar casa e carro. Faça exercícios. Viaje, conheça o mundo. Conheça a si mesmo. Compre o que está na moda. Vá ao teatro e aos festivais, seja culto. Namore. Tudo isso pra quando? Pra ontem.

Talvez com um pouco de exagero, essas são algumas das exigências que pautam a nossa vida cotidiana. É muita coisa para pouco tempo: de tudo isso, a única coisa que não muda jamais é o fato de termos as mesmas 24 horas para resolver o que quisermos. Não basta simplesmente resistirmos a tudo isso, não é tão fácil. Precisamos resistir também ao fato de que as outras pessoas estão todas fazendo coisas mais legais que nós. Estamos trabalhando? Puxa, a vizinha acabou de voltar da França. Estamos comendo miojo? Nossa, que legal, ontem aquele amigo cozinhou um salmão com bobó de camarão. Estamos andando de ônibus? É, pena que o carinha que passou por nós agora está num carrão (nota: este escritor desconhece o que seria um carro lindo e possante, então ficamos com "carrão" mesmo).

São duas as coisas que mais nos atrapalham na gerência do nosso tempo, então: o excesso de possibilidades e a inveja do que os outros estão fazendo. Ambas as coisas nascem de um pensamento que parece dirigir todas as nossas atitudes atualmente: a vida é curta, então aproveite-a ao máximo. O que ninguém para e nos diz é o que significa aproveitar a vida. (tampouco eu o direi agora, já que não é o objetivo desse texto, mas fica a promessa de uma escrita futura, embora a imagem já sugira o que direi)

"Arranje tempo para aproveitar as coisas simples da vida"


Como definir nossas prioridades?

Não existe regra para decidirmos o que é importante em nossa vida. Dependendo do que cada um de nós acredita ou está vivendo no momento, as prioridades podem variar. Contudo, podemos seguir um pequeno modelo para organizar a maneira como pensamos o nosso tempo e as nossas atividades. A disposição de realizar aquilo que queremos ao invés do que acabamos nos enrolando não tem a ver com essa organização, mas sim a criação de um hábito de agir. Vamos portanto dividir as tarefas que ocupam nosso tempo em três categorias:

Atividades importantes. Aqui entram aquelas que nós queremos fazer, que são importantes e dão sentido para a maneira como pensamos a nós mesmos. Vou me usar como exemplo: escrever, para mim, é uma atividade importante, é aquilo que eu gostaria de passar a maior parte do meu tempo fazendo. Curiosamente, eu não uso o meu tempo dessa forma e suspeito que muitos de nós (inclusive a leitora que iniciou esse texto) também não. Por que fazemos isso? As duas próximas categorias podem nos dar uma pista.

Atividades urgentes. De repente, lembramos daquele trabalho que precisamos entregar (ou corrigir) para amanhã. Ou para hoje de noite. Ou para daqui uma hora. Alarmes, alarmes, vamos correr para conseguir fazer isso a tempo. Todo o resto saia do caminho! É aí que mora o perigo, nessa realocação de prioridades entre o que consideramos importante e o que se torna urgente de ser realizado. Se, assim como eu, vocês se encontram com mais frequência batendo de frente com compromissos inadiáveis que tomam todo o seu tempo, é sinal de que as atividades importantes estão sendo negligenciadas e que o terceiro tipo de atividade está consumindo o tempo disponível.

Atividades circunstanciais. Opa, um programa legal na televisão. Ou um joguinho novo na internet. Ou aquelas três horas que passamos navegando no Facebook. Esses são exemplos de atividades circunstanciais, ou seja, aquelas que aparecem e devoram o nosso tempo, mas não são nem importantes (no sentido de que acrescentam algo aos nossos objetivos ou interesses para a vida) nem urgentes (não precisamos fazê-los nesse exato momento). Esse tipo de atividade costuma ser bastante prazerosa, o que nos faz não perceber (ou perceber e não resistir a) o fato de que o tempo está passando. Meu vício são jogos na internet. Começo com um, pensando "ah, eu trabalhei tanto, mereço um descanso antes de dormir". Faz sentido, não é? Devemos nos divertir, não é? É, o problema é que uma partida de 10 minutos se transforma em "só falta o último chefe, manhê" e ficamos horas fazendo algo que originalmente queríamos que ocupasse apenas uns minutinhos. Outro vício são seriados: assisto um capítulo, fico interessado no próximo e em seguida já estou assistindo uma temporada inteira madrugada adentro.

Trapaceando a nosso favor

Em um mundo ideal, devemos ter mais tempo para as atividades importantes, nos organizar para evitar as urgentes tanto quanto possível e reservar um espaço realmente circunstancial para as atividades circunstanciais. Só que não é simples, nós estamos acostumados, ou melhor, estamos habituados a trapacear contra nós mesmos. Porém, é aí mesmo que está a solução para nossos problemas enquanto não desenvolvemos uma consciência superior de como levar a vida: podemos trapacear também a nosso favor. Finalizarei esse texto com três trapaças rápidas que faço comigo mesmo, uma para cada tipo de atividade.

1. Trapaceando pelo que é importante. Meu objetivo de vida é escrever (e ser famoso e legal e lido e conversar sobre meus textos com todo mundo etc., mas para isso tudo preciso antes escrever). Eu gasto muito tempo no computador, que é ao mesmo tempo ferramenta de trabalho/escrita e de distração (jogos e seriados). Minha trapaça é muito simples: escrevi um bilhete colado na parede (post-its são maravilhosos para isso) dizendo para eu escrever. O modo de funcionamento é simples: volta e meia estou fazendo algo que não deveria, olho pra frente e lembro de cobrar a mim mesmo que poderia estar escrevendo. Então abro um editor de texto e escrevo.



2. Trapaceando para eliminar as urgências. Esse é um dos mais difíceis: para que as urgências desapareçam, nós podemos agendar momentos de trabalho espaçados, de modo que possamos ir realizando nossas atividades aos poucos. Tem um texto para ler para semana que vem? Coloque-o no seu tempo de "atividades que um dia serão urgentes". Uma ou duas horas por dia são suficientes para colocar tudo que terá um prazo, ou mais se for a sua atividade principal de trabalho (como freelancer, por exemplo). Para fazer isso, leia o texto anterior e crie o hábito. De início, talvez seja estressante eliminar as próximas urgências, mas aos poucos elas vão se tornando mais escassas e mais fáceis de lidar, pois teremos tempo disponível.

3. Trapaceando contra o que é circunstancial. Enquanto não aprendemos as técnicas de autocontrole, precisamos impor esse controle. Contra seriados, por exemplo, eu só baixo um número de capítulos suficiente para não me enlouquecer. Vou baixando a cada dois episódios, mais ou menos, de modo que posso assistir mais de um, mas não perco a vida assistindo a uma temporada inteira de uma vez só. Quando termino de assistir, espero alguns dias até fazer o download dos próximos capítulos. A ansiedade e o prazer na atividade circunstancial sobem e, não somente, diluo a quantidade de tempo dedicada a essa atividade. O mesmo pode ser feito com outros vícios: jogos online? Facebook? E-mails pipocando? Necessidade absurda de acompanhar o Twitter? Desligue a internet.

Aliás, eu poderia escrever um texto gigantesco sobre os benefícios de desligar a internet ou de só ligá-la durante uma tempo limitado por dia. Isso, claro, depende do que é prioridade na sua vida.
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