Conforme comecei a aprender a cozinhar, fui descobrindo que não estava apenas fazendo comida. O que eu fazia toda vez que acendia o fogo e borbulhava ingredientes não era cozinhar alimentos nem organizar refeições. Era feitiçaria, artesania, criação poética. Cada novo prato ou combinação abria um leque de possibilidades de atuação sobre a vida. Cozinhar é exatamente isso: atuar sobre a vida, sobre aquilo que nos mantém vivos.
Sempre admirei, quando criança, a maneira inventiva com que meu padrasto cozinhava. Percebia nele um grandioso prazer em transformar ingredientes soltos em prazer estésico, em sabor. Na época, para minha atual tristeza e, suponho, decepção passada dele, eu não me interessava em conhecer esses ofícios secretos que envolvem transformar o cru no cozido, no frito e no assado. Eu achava, e muitas vezes ainda me pego achando, que não precisava exercer nenhum poder sobre o mundo e que isso seria liberdade de verdade, viver sem me comprometer, sem colocar as mãos na massa (que metáfora apropriada!). Tolinho, eu.
Cozinhar algo novo que fique gostoso é parte do meu pequeno projeto para dias felizes porque é daquelas coisas que não envolvem apenas resolver problemas cotidianos: envolve encantar os paladares alheios, reunir pessoas queridas e dar sustento aos corpos. Envolve também ter algum controle ou influência sobre o que acontece na vida, ao invés de apenas deixar-se levar pelos rios do tempo.
Como todo conhecimento, o saber cozinhar também amplia a forma como vemos o mundo. Hoje percebo sabores que antes passavam em branco. Isso sem contar as amizades que se aprofundaram ao redor de mesas ou de fogões e os carinhos que se demonstram no cuidado quentinho de um prato gostoso. Cozinhar é algo sério e, principalmente, feliz. Cada minuto passado na frente do fogão me remete a todos os sabores que vivi, temperados com amores e cuidados de quem dedicou seu tempo a me permitir o paladar. Cozinhar não é perda de tempo: é investimento.
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