Meu primeiro pensamento foi: "mais uma narrativa do branco generoso que vai lá e salva o negro sofredor". A caridade, no caso, estaria reforçando a ideia de que negros precisam de cuidados advindos de brancos, que podem cuidar, que podem dispor de seu tempo para "ajudar" aos outros. Isso, claro, ignora anos de opressão. Estão imagem e mensagem sendo veladamente preconceituosas? Essa questão voltou a me incomodar semana passada, quando reli o parecer de um dos professores na minha banca de defesa do mestrado, que dizia o seguinte:
De outra parte, também cheguei a me perguntar se o texto não estaria trazendo muitas evidências (imagens, textos, referências) sobre homossexuais homens? Afinal, muito pouco ou quase nunca referes ou apresentas imagens ou referências textuais sobre as mulheres lésbicas ou mesmo travestis, para além de Laila? Mesmo quando são as tuas entradas de texto-imagem, não as das interlocutoras ou interlocutores, as imagens são sempre masculinas.
Na hora em que ouvi isso (pois me foi lido) e nos meses seguintes, pensei indignado que eu não era obrigado a mencionar aquilo que não me interessava pesquisar. No caso, meu foco era homossexualidade masculina e eu acreditava que da forma que o texto da dissertação se desenvolvia, isso ficava claro. E ficava.
O que também ficava claro, ao menos para bom entendedor, é que eu estava excluindo e invisibilizando a importância de outras personagens que também compõem o espectro da sexualidade. Eu não estava ativamente dizendo que lésbicas, travestis e transexuais não me interessam enquanto tópico de investigação ou reflexão, ou que mereceriam menos atenção que homens homossexuais. Isso sim seria um baita preconceito, não é? O que eu fiz foi ignorá-las, considerando que não era necessário sequer mencionar sua existência. Talvez eu esteja sendo exagerado, mas parece-me o mesmo que falar de "padrão de beleza ocidental" e não mencionar que ele desconsidera corpos negros. Ou asiáticos, gordos, queer etc.
Eu já escrevi sobre preconceito antes aqui e não quero me alongar muito. Queria apenas manifestar, neste texto, o quanto essas questões estão presentes em minhas reflexões e o quanto eu não enxergo nenhum horizonte próximo de solução para elas. Não sei nem o que seria uma "solução". O que fica de conselho, desta vez, é mais um convite: que tal tentarmos sempre percebermos o que ou quem estamos tornando invisíveis pelas escolhas que fazemos? Sobre quem (no sentido de "em quem estamos pisando") estamos construindo nossas percepções da realidade?