sexta-feira, março 29, 2013

Amor de mãe

raposas amando

Recebi da minha mãe por e-mail:
Estava agora há pouco lendo uma das tuas postagens no blog e fiquei como de outras vezes tanto orgulhosa quanto triste e com uma sensação frustante de ter falhado com quem eu mais amo nessa vida. Orgulhosa como fico sempre que leio os teus textos, fato. Triste e/ou  frustada por mais uma vez constatar que não estive presente quando mais precisaste de um apoio. Pois nesse caso eu que sempre me achei “sempre tão disponível” para qualquer coisa que pudesse precisar, justamente eu não consegui te passar essa disponibilidade. Então fico pensando, será que passo essa ideia tão forte de que não seria capaz de entender o que fosse que estivesse dentro do teu coração? Se não sabias ao certo, não poderíamos ter chegado a uma conclusão juntos? Serei eu tão, “fora de questão ser cogitada para uma conversa desse porte"? Eu não poderia entender? Com mãe não se fala isso? Então, se fala o quê? Abobrinhas? Quanto mais leio as coisas que escreves, tuas aventuras e desventuras, vejo o quanto estive, estou e por consequência sempre estarei fora da tua vida real. Isso me deixa com uma sensação enorme de vazio, uma tristeza que nem sei explicar. De qualquer forma eu precisava manifestar ao menos meu sentimento. Me sentir essa porta fechada não é agradável.
Ela se refere à postagem em que conto sobre a época que sofria bullying na escola. Não foi um período fácil para mim e eu não entendia nada daquilo, tampouco sabia que era algo que podia procurar ajuda. Nessas horas, a ignorância não é uma bênção. Não saber não é uma bênção, é uma maldição. Ainda por e-mail, respondi assim:
Mãe, as portas já estiveram fechadas, mas isso foi quando elas estavam trancadas também para mim. Se o texto sobre o qual tu está falando é o que penso, ele retrata um momento em que nem mesmo eu conseguia pensar sobre essas coisas, quanto mais levá-las adiante e tratar delas. Eu não conversava com ninguém sobre nada daquilo. Eu mal pensava naquilo, apenas guardava pra mim mesmo. Desde a nossa conversa em 2006 sobre meu (primeiro) namoro, sinto como se essa barreira tivesse sido levantada. Para mim foi muito complicado, inicialmente, mas nunca por acreditar que tu não pudesse saber, compreender ou participar, mas sim porque eu ainda estava contaminado com todo o medo e o ressentimento que o mundo me ensinou a ter sobre sexualidade. Hoje eu me sinto aberto para conversar contigo sobre o que for, sobre quem for, sobre o que me emociona e o que me distancia. Penso que, nas oportunidades que temos para estar juntos, falamos de coisas que sabemos que são só para os ouvidos um do outro e isso me deixa feliz por saber que tenho uma relação contigo que é a que sempre quis ter com qualquer pessoa que amo: de verdadeira amizade e confiança. Te amo, mãe!
Levando minha vida, eu não tinha ideia dessa preocupação no coração da minha mãe, algo que muita gente enfrenta e tanta gente mais nem sabe o que é, pois não tem uma mãe capaz de se doer por não estar ainda mais na vida do filho. Eu tenho e, por mais que fique triste em saber que, de alguma forma, a deixei magoada, fico feliz em saber que ela está ali e que pode me escrever essas palavras, pois sabe que eu a amo e vou não só levá-las em consideração, mas também refletir a respeito e mudar minha vida baseado no que ela sente.

Nossa conversa foi encerrada por uma resposta dela:
O texto que resultou nesse desabafo foi depois de ler, creio o último, mas não foi só por ele, talvez por todos eles, pois me mostram algo que eu deveria ter percebido, quem sabe procurado. Ao mesmo tempo que “Eu” penso que quando a gente tem alguém que confia plenamente, é para essa pessoa que a gente corre e se aninha para se acalmar, se recuperar e se reenergizar para poder enfrentar as dificuldades da vida, também penso agora olhando um pouco para mim, que muitas vezes nossas aflições ficam tão grandes que a gente sequer ousa falar até para nós mesmos, que dirá para outros.
amor de raposas

Tenho com minha mãe uma relação que é linda. Eu confio nela e sei que posso ir até ela para falar sobre absolutamente qualquer coisa. Sinto falta da sua presença no meu cotidiano, pois moramos em cidades distantes, mas a certeza desse amor é algo que me facilita viver. Eu sou uma raposa de sorte.

8 comentários:

Unknown disse...

Raposa tocando em nossas emoções e nos fazendo exprimi-las com lágrimas quando simplesmente nos faltam as palavras.

FabioS disse...

A força da vontade de verdade está expressas nessas palavras sinceras. Obrigado por compartilhar uma das brechas significativas no meio do nevoeiro das aparências. Obrigado por compartilhar essas palavras sinceras, meu amigo.

Policromo disse...

Poxa vida, que lindo! A tua mãe teve a oportunidade de mostrar uma realidade que acontece com TODAS as mães (e pais, e irmãos, e flhos, cômjuges, etc.), mas que pouquíssima gente tem coragem de assumir.

Quando a gente convive direto com alguém, nem sempre a gente olha "direto" pra essa pessoa... porque olhamos através do que nós aprendemos sobre ela na primeira vez que a conhecemos.

A visão congela, a vida evolui.

Tales disse...

A visão congela, a vida evolui. Excelente definição, Lúcia.

Vivian disse...

Primeiro pensamento: ops, a mãe do Tales lê o blog dele. OOOO

Segundo pensamento:

Nossa, que lindo.
Me emocionei lendo.
Pelo teu blog tua mãe tem acesso a coisas de ti que ela jamais teria... linda a reflexão dela. Tu realmente teve a quem puxar.

Beijos =*

AleXenite disse...

Mãe é... polêmico. Uma pena que nem todas tenham uma mente mais maleável como a da tua mãe.
Belas palavras, tu realmente escreves muito bem. Abraço!

Lorena disse...

Tales, esse post mexeu numas feridas que eu tenho e tentava ignorar, mas que não devem ser ignoradas caso eu queira que elas um dia se curem. Li ontem e ainda estou meiuo abalada, até hj. Estou distante da minha mãe, dos meus pais, e há coisas, mtas coisas, que eu queria dizer a eles... Mas não estou forte o suficiente ainda para trazer tudo a tona novamente.
Porém esse email da sua mãe me deu uma ideia de como devem estar os sentimentos da minha... e doeu, rapaz, bem fundo em mim.
Neste momento tudo que eu posso fazer é me aprofundar mais ainda nos meus sentimentos e criar forças para ter a conversa necessária. Eu só sei que não quero que minha mãe se sinta assim.

Um beijo, obrigada por se expôr e, consequentemente, me expôr.

Tales disse...

Lorena, muitas vezes o que nos falta é um empurrão da vida =)

Espero que esse texto te empurre a fazer o que tu acha que é certo.

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