quarta-feira, dezembro 14, 2011

O banheiro de quem?


Eu dou aulas sobre sexualidade. Em um dos cursos que ministrei, utilizei uma outra tirinha do Laerte com a personagem Muriel para discutir justamente qual era a função dos banheiros separados por gênero. Ou, digamos, por sexo, já que mesmo que você seja uma mulher extremamente masculinizada, ou um homem feminino, seu banheiro corresponde ao fato de você mijar em pé ou sentado. Uma das alunas me perguntou qual era o banheiro utilizado pela travesti, o que iniciou uma discussão acerca do incômodo para esse sujeito transitório, mas também (e principalmente) para a pessoa que está dentro do banheiro dito correto. "Por que eu tenho que lidar com o desconforto de ter um travesti no meu banheiro?".


Esse é um dos reforços mais curiosos que percebo em relação a quem e como deve ser homem, quem e como deve ser mulher. Se nossas casas, em sua grande maioria, possuem banheiros mistos, por que estranhamos tanto a possibilidade de existirem banheiros assim nos espaços públicos? Qual é o argumento que sustenta essa separação? Falta de higiene masculina? Perigo para as mulheres? Bem, nós obviamente vivemos em uma sociedade machista misógina cretina. Altas chances desses medos se tornarem realidade. Eu ia, até uma hora atrás, pregar sobre um mundo ideal, agarrado ao utópico e às possibilidades de convivência. Só que, pensando bem, existem momentos em que é realmente difícil acreditar que isso seja possível. Quero dizer... digamos que todos usem banheiros mistos, aí um fiodaspu vai lá e estupra, bate, abusa de alguém. Não é difícil de imaginar o cenário, noite escura, horário vazio, silêncio. Ou muito barulho, para abafar tudo. Aí acontece e alguém levanta para dizer "viu? É para isso que existe essa separação!".

Não é, mas nós chegamos a um ponto tão complicado de existência em que esses poderes e abusos se misturam de uma forma aparentemente irreversível. Não dá para eliminar as disparidades de gênero sem acabar com o privilégio masculino. O que, creio, é intocável sem o fim das diferenças de gênero. Está aí algo que terei que pensar com muito mais carinho... Aceito sugestões...

* * * * *

Em tempo, comentei sobre como banheiros reforçam papéis de gênero e pelo jeito a coisa não é tão evidente quanto eu pensava. Vamos imaginar banheiros públicos, certo? Ignoremos shoppings, por enquanto. No geral, banheiro masculino não tem espelho. Feminino tem. "Ah, mulher se cuida mais". Isso, digníssimos, é papel de gênero. Construído socialmente. Tem mais: uma amiga veio aqui e não usou o meu banheiro, pois estava sujo. Eu pedi desculpas e ela me respondeu que era um típico banheiro de homem solteiro. Verdade, é mesmo. Por quê? Por eu ter sido sempre liberado de limpar coisas em casa, pois havia mulheres para fazerem esse serviço para mim.

Parece coisa pequena, mas é daquelas que vai crescendo conforme a gente vai enxergando o que meninas não podem fazer que meninos podem, o que garotos aprendem que garotas não precisam etc. Eu aprendi a achar que isso é só papinho de feminista exaltada. É um pensamento perigoso de reforço às condições humilhantes às quais as moças são submetidas. Igual a ter medo de andar sozinha. Como resolve?

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