segunda-feira, abril 01, 2013

Como sair do armário

De acordo com a Wikipedia, sair do armário significa fazer "o anúncio público da orientação sexual ou identidade de gênero de alguém, ou de si próprio". É sobre isso mesmo que estou escrevendo hoje: sobre essa mania irritante que o mundo tem de querer que anunciemos nossa identidade, como se gostar de homens me tornasse um tipo diferente de pessoa.

gays saem do armário
"Eu preciso confessar... Gordo, eu sou gay"
Só quando rolou a minha primeira experiência sexual com um cara é que passei a perceber minha vida como algo possível. Até então, eu sabia que não conseguia me relacionar direito com seres humanos da forma heteronormativa (para entender melhor, veja o que escrevi aqui e dê uma olhada na Wikipedia) que todos esperavam. O que eu não entendia é que poderia me relacionar de tantas outras formas! Quando voltei à minha rotina (eu estava na metade da faculdade), passei a me ocupar de duas coisas: (1) viver e experimentar a vida; e (2) conversar com as pessoas.

Viver e experimentar a vida

Nem sempre a gente tem ciência do que pode fazer. Muitas vezes, aliás, não saber que algo é possível acaba nos limitando. Nem todos temos coragem de sair e desbravar o mundo sem saber o que nos espera. Eu, por exemplo, sempre fui medrosinho. Até tentava aqui e ali alguma interação afetiva/sexual com outros moços, mas era tão sem jeito (e estava procurando tão no lugar errado) que nunca rolava nada.

Depois que entendi que não precisava ser igual a todo mundo, passei a procurar oportunidades de exercer meus desejos. De vivê-los. Aos poucos, foi ficando claro que sair de casa, ir em festas e conhecer pessoas através da internet eram boas maneiras de alcançar esse mundo do qual eu queria participar. Ficar sentado em casa desejando é algo que mais nos machuca do que ajuda.

Conversar com as pessoas

Esse é o ponto que normalmente as pessoas consideram "sair do armário". Cada pessoa tem uma capacidade diferente de lidar com a vida e com as suas pressões. Eu, por exemplo, precisava verbalizar (falar e escrever) para tornar real o fato de gostar de rapazes. Aos poucos isso deixou de ser uma necessidade, mas meus primeiros passos na vida sexual realmente precisavam desse apoio. Se isso acontece, "sair do armário" é um bom caminho.

Eu conversei primeiro com o meu melhor amigo na época. Ele me indicou um outro amigo, que também gosta de moços, e a partir daí eu tive com quem conversar abertamente e trocar ideias e experiências. Saber que não se está sozinho é uma das coisas mais maravilhosas que existem. Até então, eu estava. Como eu não entendia o que estava acontecendo com meus desejos, eu não sabia como procurar ajuda. Para mim não fazia sentido gostar de homens, isso era algo que simplesmente não existia. Através dessas conversas com meus amigos (e fui contando cada vez para mais amigos, de modo a tornar minha realidade mais real), a coisa foi tomando forma.

A família

Foi então que comecei a namorar. Até então, nem pensava em contar nada para a família. Simplesmente não parecia algo que eles precisassem saber. Contudo, veio o dia em que eu queria receber meu namorado em casa, queria que ele fizesse parte do meu espaço, mas meu irmão estava lá. Contei pra ele (foi difícil, mas aliviante. Ele não conseguiu lidar muito bem com a ideia inicialmente, então explorou bem o item "conversar com pessoas" e contou para basicamente todos seus [alguns meus] amigos) e consegui o queria: meu namorado e eu passamos a ter um senso de família, já que aos poucos ele e meu irmão começaram a se conhecer.

Depois de alguns meses namorando, chegou o momento de contar para a minha mãe. Algo curioso sobre isso tudo é que eu nunca tive medo das pessoas deixarem de gostar de mim ou me recriminarem. O medo que eu tinha era de saber que um homem gostar de homens era socialmente reprovável. Esse foi, aliás, o medo também expresso pela minha mãe: que eu sofresse na sociedade em que vivemos.

E quando não dá?

Nem todo mundo tem a sorte que eu tenho de nascer numa família compreensiva e carinhosa. A gente geralmente sabe se pode confiar/contar ou não. Assumir uma identidade é tomar uma posição política, é dizer "eu falo deste ponto de vista", "eu sou isso". Em muitos contextos, isso pode significar (e muitas vezes significa) dor, arrependimento, expulsão de casa, violência etc.


Não é fácil acreditar que não se tem a quem recorrer. Por isso, assumir uma identidade é algo que não deve ser feito se tiver um grande potencial de colocar a vida em risco. Certa vez vi em uma palestra que devemos escolher lutas pequenas suficientes para ganharmos, mas grandes o bastante para terem importância. Esse é um desses casos: se dependemos da nossa família e acreditamos que ela não nos dará suporte, que talvez até mesmo nos tire suporte, então o silêncio pode ser uma escolha política. Temporária, mas útil.

O mais importante, em qualquer caso, é encontrar pessoas nas quais possamos confiar. Grupos de apoio a LGBTs. Comunidades. Professores. Colegas. Amigos. Nem sempre será fácil reconhecer essas pessoas e algumas podemos até nos enganar, mas aos poucos vamos aprendendo a caminhar pela vida e a reforçar nossas posições. A melhor ajuda que podemos encontrar é aquela que não nos deixa sozinhos.

Um comentário:

Lucas disse...

Amo que a sorte caminhe a meu favor também! Mas, hajam casos em que acontece o contrário não?! No caso da familia, é exatamente o que ocorreu comigo! Há um certo modo de alguns nao "saberem" mas "sabendo"..um subentendido! Rs. E sim, socialmente falando, acredito que o tempo fará bem, muito bem ás sociedades :p

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