quinta-feira, novembro 02, 2006

saudade egocêntrica

Não faz tanto tempo que o futuro deixou de o ser e virou presente. O problema é que o que era o agora se tornou o ontem e, nesse interim, eu descobri que estava meio apaixonado por quem eu era.

Era uma época fácil de entender as coisas. Minha vida estava pautada por negações e fugas, e eu sabia exatamente as razões de cada uma delas. E eu seguia assim, para o bem da minha sanidade. E tudo seguia. Não é que eu gostasse, era só que o medo de mudar era grande demais, a chance de dar errado e de tudo aquilo que eu tinha. Engraçado que eu tinha quase nada.
nesse tempo que eu aprendi a ser mimético (abstrai e continua lendo), capaz de circular onde eu quisesse sem ser notado e, quando percebido, sem ser compreendido. Foi um período tão estranho que eu era capaz de acreditar nas minhas próprias invenções sem muito trabalho.
eu estava seguro, havia construído um muro ao meu redor. Ninguém chegava até mim, ninguém entendia, ninguém enxergava minhas feridas. Nada mais prático. Nada mais triste, também. Well, era o preço a ser pago pela proteção.

Acontece que o tempo passa, e cansei de ser eu.
a mudança foi brusca, truncada. Foi 2006 que chegou e acabou com o que antes era o passado. Ano novo, vida nova. É, foi exatamente assim.
porém eu desconhecia as regras, a única coisa que tinha em mente é que queria jogar. Eu, que estava fechado para tudo há tanto tempo, abdiquei da minha habilidade mimetista. Para que eu pudesse entender o mundo que então queria pra mim, eu precisava que o mundo me entendesse e me ajudasse no processo.
fiz amigos, sofri amores, confiei. Vivi. Mudei.
doeu. E ainda dói, algumas vezes.

E eu não conseguia largar o passado. Seguia preso a ele, relembrando-o o tempo inteiro, pois era um mundo que eu entendia, não um cheio de regras novas e reviravoltas complicadas. Não um tão complicado, onde a negação não dita tudo que acontece.
algumas vezes o antigo eu volta pra conversar, e eu lhe dava bastante espaço. Eu precisava dele para me reafirmar como quem eu não era mais. Isso foi muito importante pra mim, não ser quem eu um dia fui.
contudo, não sendo quem eu já fui, eu também não estava sendo quem eu era. Foi preciso muita força pra guardar o antigo no passado e viver o atual, do presente. E também para perceber que o próximo, no futuro, pode estar chegando a qualquer momento. A todo momento.

Agora meu antigo vive numa caixinha dentro do meu peito. Essa caixa sacode o tempo inteiro, às vezes fraco, às vezes mais forte, mas eu sempre sei que ela está ali. Ele quer voltar, e continua me oferecendo habilidades que hoje eu tenho medo de usar. Mimetismo é tentador.
e eu preciso dele aqui, junto comigo. Preciso dele porque, sem, eu não existo. Já não posso mais viver no passado, e isso é bom. Já não consigo voltar ao passado, nem para respirar um ar mais puro.
isso não é bom.

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